Do Taremi à lua
O que o futebol de Taremi tem a ver com metáforas para além do passe de letra e da lua
POR ter descoberto cedo que o futebol não se joga só na relva e no pé, também se joga na alma e na cabeça - vendo os seus avançados a falharem mais do que deviam (ou a embrulharem-se em dúvidas) Bill Shankly largava-lhes, filosófico, o brado:
- Se estás dentro na área e não sabes o que fazer com a bola, mete-a dentro da baliza que depois discutimos, então, a melhor opção.
A cada jogo que passa, mais eu vejo no Taremi esse bom espírito, mais o Taremi mo mostra sem ser só quando mete a bola na baliza (ou fora dela). E também me vai lembrando Borghi, que Maradona levou à vitória no Mundial de 1986 em Mão de Deus. Era especialista em passes de letra e, certo dia, decidiu desmistificar o que se achava ser o seu sortilégio:
- Fazer um passe de letra não é um luxo nem é uma demonstração de qualidade - é simplesmente o declarar que a outra perna não serve para nada…
É, é verdade: às vezes o melhor que um jogador tem à mão é uma perna que parece que não lhe serve para nada e lhe dá a possibilidade de fazer um passe de letra (mesmo não sendo passe de letra) ou um golo (mesmo que não seja golo seu) que mude o destino a um jogo (ou uma vida) - e também aí, nesse jeito, eu vejo o Taremi levando a sua equipa do lugar onde ela está para um lugar bem melhor. Fá-lo porque não é daqueles jogadores que jogam o jogo todo só com a baliza do adversário entre os olhos (aliás, quem está sempre em campo a fazê-lo acaba por estar em campo sem fazer o melhor que devia, mesmo sendo ponta de lança) - é daqueles jogadores que jogam cada instante do jogo com a ideia dum poeta dentro de si, a espicaçá-lo:
- Aponta sempre para a lua porque mesmo que não lhe acertes ficarás mais perto das estrelas…
No caso dele, o que se vê é que Taremi não vê a lua apenas na baliza contrária, vê-a na chuteira de companheiros - sempre a mostrar que estranho (ou pior) é ver-se, entre ele e os demais, um «ADN defensivo» (seja lá o que isso for...).