Do Lyon ao Marítimo
Leonardo Jardim aproveitou o exemplo do seu jogador Pietro Pellegri (18 anos), que custou muito dinheiro, mas é pouco utilizado por causa de lesões frequentes, e alertou para o perigo da formação acelerada de jovens futebolistas de modo a rendibilizar investimentos avultados sem medir consequências que, no limite, poderão destruir as carreiras dos praticantes.
Se há treinadores com autoridade para assim falarem Jardim é um deles, pois em 2017, ao serviço do Mónaco, apesar da sombra do poderoso PSG, foi campeão de França com uma equipa de meninos, deixou a Europa muda de espanto e, nos meses seguintes, provocou o entupimento dos acessos ao principado com camiões cheios de euros para serem trocados por virtuosos da bola. Excluindo o guarda-redes e os centrais, mais Radamel Falcao, a estrela polar da equipa titular monegasca eram miúdos talentosos, uns mais, outros menos, dos laterais Sidibé e Mendy aos médios Fabinho e Bakayoko no apoio a um trio mágico constituído por Bernardo Silva, Lemar e Mbappé.
Numa altura em que o tema continua em voga entre nós, derivado da grande aposta de Luís Filipe Vieira e que tamanha barulheira tem suscitado, o princípio de pretender recuperar o prestígio europeu do Benfica a partir da chamada prata da casa não é má ideia. Pelo contrário, será a via mais rápida e segura, além de menos dispendiosa, para se alcançar o objetivo pretendido.
Um miúdo não é um adulto em miniatura, sublinha Leonardo Jardim, por isso é preciso paciência e atenção no seu crescimento. Se Pellegri tivesse beneficiado desse acompanhamento competente não teria, hoje, «todas estas lesões musculares», acentua.
Qualquer questão, independentemente da importância, relacionada com o processo de formação é valorizada na academia do Seixal, mas o problema é outro e reside na abordagem leviana que se faz do projeto de Vieira, avaliado, somente, em função do resultado imediato.
Se corre bem, é uma maravilha, mas se corre mal logo se agita a turba discordante, a qual, decretando que isto não vai lá com meninos, como se leu e ouviu a seguir a Lyon, aplaude a opção pelo adulto, pela ratice, pelo músculo, como aconteceu em Leipzig, e, no entanto, sopesadas as duas experiências, conclui-se que apenas mudou a atitude, que nada tem a ver com idades, porque, no resto, a madureza encarnada de pouco serviu para contrapor ao irrequietismo alemão.
Bruno Lage irritou-se no sábado, mas devia ter expressado o seu desagrado ainda em França e não permitir que os miúdos Tomás Tavares, Gedson Fernandes e Florentino fossem destroçados pela opinião pública. Este último, então, passou de titular a tempo inteiro a suplente esquecido, o que faz emergir um par de dúvidas: ou os putos se comportaram muito mal ou o treinador estava farto deles e apenas esperava uma oportunidade para os afastar.
Em Lyon falhou tudo, frise-se, como falhara em S. Petersburgo, quando o presidente disse que se sentia envergonhado. Lage resolveu alterar e afastou a miudagem sem reparar, porém, que era Gabriel quem estava no epicentro do abalo: participação muito negativa em França, desempenho inadmissível diante do Santa Clara, atuação medíocre em Vizela, escapando ao vermelho por um triz, sem pernas nem classe para a fogosidade dos alemães e sem calma e outra vez sem pernas frente aos maritimistas. Parece que andava atrás da expulsão, talvez como mecanismo de defesa por não se sentir em condições, como a sucessão de pálidas e comprometedoras exibições demonstra.
Lage desabafou e fez bem, porque sofrer para dentro não se recomenda. Foi aguentando até não poder mais, cabendo-lhe agora explicar por que motivo não retirou Gabriel da equipa há mais tempo em vez de andar com adaptações que funcionaram bem no sábado passado, mas, julgo, convencem pouco: o Marítimo foi um agradável adversário que discutiu o jogo no campo todo. Foi atrevido, assustou, mas, naturalmente perdeu. De toda a maneira, merece o aplauso do público que gosta de assistir a bom futebol.
Gabriel apresenta fortes argumentos ao nível da execução e da leitura de jogo e faz a diferença quando está a cem por cento do ponto de vista físico, mas aparenta ser um jogador sazonal, de meia época em alta e outra metade em banho-maria.
Das fornadas do Seixal, no relvado da Luz, estiveram Rúben Dias, Ferro, Jota e Tomás Tavares, mais Florentino, no banco, prova de que o caminho é por aqui. Pelo menos, no Mónaco, com Leonardo Jardim, foi. Desde que haja tempo e paciência e que a cada resultado negativo não se coloque tudo em causa, como é costume. Os números do Benfica no consulado de Lage são fantásticos e apesar disso não deve haver programa em que o nome do treinador da águia não seja tema de discussão nas muitas tertúlias comunicacionais. O que nada tem de errado, mas em algumas abusa-se no dizer mal.