Discurso directo

OPINIÃO15.02.202003:00

Quando escrevo os meus artigos dirijo-me, obviamente, a todos os leitores, sem estar a pensar em ninguém, em particular. Alguns interessarão mais aos sportinguistas, o que também é normal, como também é normal que uns gostem e outros não. Na minha intervenção pública, não posso, nem quero, agradar a todos, porque mesmo estando calado, ainda assim não agradaria a todos.


Ultimamente, tenho pensado muito a verde e branco, e escrito nessas mesmas cores, produto da minha reflexão. Esta semana, porém, a escrita a verde e branco é em forma de discurso directo, porque é dirigida a uma pessoa que me merece respeito e consideração pessoal e institucional - o Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Sporting Clube de Portugal, Dr. Rogério Alves.

Meu Caro Presidente:
Sem grande surpresa, a Mesa da Assembleia Geral do SCP, a que ilustremente preside, decidiu este semana que ora termina indeferir o pedido de convocação de uma assembleia geral para deliberar sobre a destituição dos órgãos sociais pois, sobre essa matéria, só ela pode deliberar, como é sabido.
Como sabe já tinha manifestado a minha posição contra a apreciação da justa causa por parte da Mesa ou do seu Presidente, mas também logo referi que, fosse qual fosse a posição tomada, estava seguro que sua posição seria fundamentada juridicamente, e não com base em conveniência ou no politicamente correcto.
Deixe-me, de resto, que lhe diga a minha opinião sobre o que seria politicamente correcto -  a convocação da assembleia geral com o objetivo da apreciação da justa causa invocada e, em consequência, deliberar sobre a proposta de destituição, aprovando-a ou rejeitando-a. Das conversas que tive, antes e depois da decisão da Mesa da Assembleia Geral, fiquei absolutamente convicto que, face aos últimos acontecimentos,  graves a todos os títulos, e por isso mesmo preocupantes, a questão de poder e do poder ficaria entre o Conselho Directivo e as claques. E, nesta conformidade, não tenho dúvidas, que a maioria silenciosa, que sempre existe em qualquer instituição, não teria dúvidas em recusar a destituição. E o Conselho Directivo sairia se calhar reforçado pela maioria dos votantes, o que não aconteceu no acto eleitoral de 2018, fosse no número destes fosse no número de votos.


De resto, também deixei bem claro, que a destituição não resolveria nada do que urge resolver, pois as consequências seriam as mesmas ou similares da destituição acontecida em 2018: eleições, mais meia dúzia de candidatos e, possivelmente, mais um presidente sem maioria absoluta, já que, até hoje, ainda não houve uma alma leonina que apresentasse uma proposta para haver uma segunda volta. Todos falam, mas ninguém faz nada, porque muita gente, demasiada gente, já percebeu que dessa forma será difícil ser presidente do Sporting Clube de Portugal, afinal um lugar de muito sofrimento, mas também muito cobiçado!
Aliás, como todos sabem, o Sporting não tem dificuldade em mudar de direção, porque há gente que acha que democracia é isto mesmo: vão uns e vêm outros, como quem troca de camisa. Ora, o Sporting não precisa de mudar de camisa e, muito menos de camisola! O Sporting precisa é de mudar de vida, e essa mudança necessita de verdade e de rumo, duas coisas que não abundam na actual situação, para não dizer que não existem.


Contudo, meu caro Presidente, a não destituição também não resolve, nem vai resolver, coisa nenhuma, e isso é que me preocupa, porque o clima que se vive é de uma guerra civil que, desgraçadamente, tende a continuar a agravar-se. É um termo que me custa usar porque ofende os povos que foram vítimas desse tipo de guerras injustificadas e injustificáveis. Se o uso, é porque não sou o primeiro, e para que a força de expressão sirva de alerta para todos quanto às consequências.
A lista em que foi eleito tinha por lema Unir o Sporting. E, se o Conselho Directivo até agora nada fez nesse sentido, por culpa própria, não quero deixar de lhe solicitar, para não dizer rogar, que faça algo nesse sentido, enquanto Presidente da Assembleia Geral.


Os nossos estatutos, a precisar de mudança, e por cujo cumprimento deve velar a Assembleia Geral a que ilustremente preside, fala, no seu artigo 61.º, de Família Leonina, atribuindo competências ao Conselho Directivo para expulsar dela as entidades que a integram se não respeitarem  os estatutos, se comportem de forma que desprestigiem o clube, que prejudiquem ou impeçam o exercício das funções dos órgãos sociais do Clube, que injuriem, difamem ou ofendam estes ou os seus membros, que com a sua atividade desvirtuem os fins para que foram criados. É o cenário actual, mas não é manifestamente o que precisamos.
Precisamos de alguém que se ponha acima das guerras, como das guerrinhas, sendo que estas, por vezes, corroem mais do que aquelas. Alguém que tenha a coragem moral de romper com interesses e mexericos, que erga a voz da consciência acima de tudo e de todos, e que obrigue todos à verdade e à humildade. É a verdade e a humildade que deve presidir ao diálogo que deve ser promovido.

Senhor Presidente:


Foi seguramente com tranquilidade na consciência e serenidade no pensamento que decidiu juridicamente da não convocação da assembleia para destituição dos órgãos sociais. Embora, juridicamente, discorde da decisão, respeito-a, quanto mais não seja porque, humildemente, admito que possa não ter razão.
Acresce que a questão jurídica é importante porque vivemos num Estado de Direito, mas não chega para trazer a paz quando a guerra está no terreno. A decisão, qualquer que fosse, nada pacificaria, antes iniciou, se calhar, outra guerra, que esperemos se limite ao campo da discussão jurídica.
A anteceder o Presidente da Assembleia Geral está o advogado eminente e o jurista brilhante. Ultrapassada esta faceta da sua personalidade, precisamos do Presidente da Assembleia Geral, de palavra fácil e estilo eloquente, a promover o diálogo, que nos pacifique e una na definição de um rumo, com o mesmo desígnio: «um clube tão grande como os maiores da Europa». Está nas mãos da entidade mais representativa do clube essa responsabilidade. Espero que também no ânimo!