Desmontando a ladainha

OPINIÃO27.05.201804:08

BRUNO DE CARVALHO vive - e sabe-o - o momento mais delicado da sua presidência. Aliás, se dúvidas existissem sobre ter o presidente do Sporting noção de que ultrapassou todos os limites, elas ficam desfeitas pelos últimos e sucessivos passos atrás de alguém que ao longo dos últimos cinco anos preferiu sempre a política do antes quebrar que torcer. E mais evidente fica a fragilidade de BdC quanto se percebe estar a fugir ao escrutínio dos sócios, logo ele que esteve, neste capítulo, sempre ao ataque, utilizando assembleias gerais para reforçar um poder que nunca tinha estado, até agora, verdadeiramente em causa.

É impossível dizer, a esta distância, que Bruno de Carvalho vai levar, no dia 23 de junho, um cartão vermelho dos sócios do Sporting. O presidente leonino revelou-se, sempre, um mestre na manipulação das massas e as próximas semanas serão passadas a empurrar as culpas, em comícios disfarçados de sessões de esclarecimentos em que repetirá uma ladainha que convém desmontar:

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que, na noite do jogo em Madrid, criticaram de forma absurda os jogadores, dando início a uma guerra de proporções então ainda inimagináveis entre Direção e plantel;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que ameaçaram com processos disciplinares aqueles que ousaram fazer-lhe frente;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que, a menos de 24 horas do jogo com o Paços de Ferreira, reiteraram as críticas a futebolistas e equipa técnica, criando um ambiente em Alvalade que deixou, desde logo, evidente que Alvalade começava a perder a paciência para o seu presidente;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que, a 24 horas do encontro com o Marítimo, que decidia a possibilidade de chegar à Liga dos Campeões da próxima época, voltaram a carregar contra jogadores e treinador;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que, na semana que antecedeu a final da Taça de Portugal, informaram o treinador que estava despedido sob ameaça de um processo disciplinar com suspensão que, ainda hoje, não se sabe se avançará ou não;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que tiveram declarações profundamente infelizes depois das agressões de que o plantel foi vítima em Alcochete;

- Não foram os jornalistas nem os seus críticos (os de sempre e os mais recentes) que, a 24 horas da final da Taça de Portugal, veio culpar, mesmo que indiretamente, os jogadores pelas agressões de que foram vítimas.

Bruno de Carvalho pode dar as cambalhotas que quiser, pode não se demitir (está no seu direito), mas não pode fugir às suas responsabilidades. E, por ter culpas evidentes numa crise tão profunda e de consequências imprevisíveis, merece ficar nas mãos dos sócios, que são - como o próprio sempre fez questão de frisar - os verdadeiros donos do clube. Terão de ser eles a decidir que futuro querem para o seu Sporting, assumindo depois as consequências dessa decisão. Simples. Aí se verá, então, se a estratégia de vitimização pensada pelo ainda presidente chegará para convencê-los de que tudo o que se tem passado se trata, apenas, de uma perseguição a quem não teve problemas em intitular-se de enfant terrible do futebol português ou se Bruno de Carvalho ficará na história apenas como um menino mimado que faz birra sempre que alguém não diz yes aos seus caprichos, por mais absurdos que sejam.

Na história ficará sempre Bruno de Carvalho, independentemente do que acontecer no dia 23, como o presidente que desperdiçou, em apenas alguns meses, um apoio que quase chegou aos 100 por cento. Talvez tenha sido esse, afinal, o seu problema.