Desejos viáveis e inviáveis para 2020
Calhou-me escrever esta página na primeira edição de 2020. É da tradição, mas é igualmente do coração, que comece por desejar Bom Ano a todos, independentemente das suas preferências e cores clubísticas. É verdade que no desporto não há vitórias sem derrotas, mas pode e deve haver sã convivência entre vencedores e vencidos, desde que impere o sentimento de justiça e fair play, o que, em abono da verdade, raramente acontece no futebol.
Entre os meus desejos para 2020 no plano desportivo não podia ter outro que não fosse o Sporting vencer a Liga. Dirão que é impossível; eu direi que quase por certo tereis razão, mas que neste jogo há mais imprevistos do que impossíveis, e é isso que o torna tão atraente. Deixem-me, portanto, desejar mesmo isto, algo que parece inviável.
Para tal torna-se imperioso derrotar, já no domingo, o Porto, e esperar que sábado um arremedo vimaranense derrote o Benfica. Seria um bom começo, tanto mais que no dia 18 deste mesmo mês teremos o Benfica pela frente e mais uma vitória seria de estrondo. Confesso-vos que esta não é a minha convicção profunda, mas é o meu profundíssimo desejo. E havendo uma contradição entre a convicção e o desejo, só peço aos deuses que seja surpreendido, mesmo sabendo que, com tudo isto cumprido, ainda ficaríamos a sete pontos do clube da Luz. Enfim, é difícil, lá isso é.
Depois, a 21 ainda deste mês, temos em Braga a primeira meia-final da Taça da Liga. Aqui o desejo é simples e até mais concretizável: voltar a vencer esta competição de inverno. Bem sei que é o patinho feio das competições portuguesas, mas tudo é bom para nos dar ânimo - aquele ânimo que se viu na reviravolta dos 2-0 para 2-4 em Portimão. Posto isto, e passando à final, seja com o Porto ou com o Guimarães (que afastou o Benfica da final four, bom prenúncio para sábado), vencer a Taça pela segunda vez consecutiva. Seria um bom mês de janeiro, capaz de ultrapassar muitas desilusões, depressões e até maledicências que por aí vão. É impossível? Ser não é, mas necessita-se de muito ânimo, cabeça fria, sorte e determinação.
Mais justiça
Um outro desejo, que tem a marca de uma exigência, é o de haver mais justiça no desporto e no futebol em particular. A despenalização de Bolasie para o jogo com o Porto foi de elementar bom senso, mas não é, sobretudo, a este tipo de justiça que me refiro.
Pretendo salientar, em primeiro lugar, as denúncias de Rui Pinto, que recaem sobre grandes clubes portugueses, entre os quais os três grandes. Espero, sinceramente, que além do eventual castigo que Rui Pinto mereça, todas as suas denúncias sejam seriamente investigadas e, se for o caso, punidas doa a quem doer. Já são demais as suspeitas que rodeiam uma série de ações do universo benfiquista, por exemplo, sem que nada se apure nem nenhuma iniciativa seja tomada. Desde o envolvimento do clube com um magistrado que foi proibido de exercer a magistratura, às suspeitas de resultados combinados, de árbitros corrompidos e sei lá que mais, há de tudo. É verdade que podres iguais são apontados a outros clubes, incluindo o Sporting. Mas não pretendo que alguém fique de fora da alçada da investigação profunda que estes casos merecem.
Deve ser também este mês que, finalmente, se inicia o julgamento do assassínio de Marco Ficini, o adepto italiano do Sporting mortalmente atropelado junto ao Estádio da Luz. Passaram quase três anos (o incidente foi em abril de 2017) e há quase três anos que foi identificado o suspeito que irá a julgamento acusado do homicídio de Marco e de mais quatro homicídios na forma tentada. Em julgamento estarão, além de Luís Pina, arguido enquanto autor material, mais nove adeptos do Benfica (daquela claque que não existe e se chama No Name Boys), e uma dúzia de membros da Juventude Leonina. Para todos os que forem julgados culpados, espera-se mão pesada. O futebol não precisa deles.
E não se pode encerrar os casos de justiça sem referir o julgamento do assalto a Alcochete, que decorre em Monsanto. O desenrolar das sessões tem vindo a iluminar muitos pontos obscuros da história. Só se pode esperar que seja feita justiça e que os culpados sejam devidamente punidos.
Para a determinação de culpas e punição de todos estes casos há um dado sempre em falta: a pressão dos clubes (a boa exceção, que penso ser visível e não fruto de enviesamento clubístico, é o Sporting), da Federação e da Liga. Qualquer dos episódios atrás descritos minam a confiança e o espírito desportivo que deve presidir ao futebol. Arrasam a credibilidade e afastam dos campos os adeptos pacíficos que não gostam de estar metidos em confusões, rixas ou batalhas campais. Seria, pois, esperável que os organismos que tutelam o futebol fossem mais ativos nesta frente. Assim como o Governo, no que toca à tutela dos Desportos. Faz hoje oito dias, o responsável da pasta, João Paulo Rebelo, ao encontrarmo-nos num funeral de um querido familiar meu, em Viseu, que é também a sua terra, assegurou-me estar muito atento e atuante nesta frente. Espero que tenha razão e que esta minha insistência seja escusada. Porém, pelo sim pelo não, caro João Paulo, insisto.
Paz no Sporting
Oterceiro desejo (são sempre três os desejos concedidos pelos génios) tem a ver exclusivamente com o funcionamento interno do Sporting. É preciso, como não me canso de dizer e escrever, mais unidade, mais coesão e mais transparência.
O Sporting pode ficar incomodado quando se diz que tem jogadores em saldo, mas antes disso deveria explicar pacientemente a sua situação financeira. Desculpem, e sem qualquer intenção contestatária o digo, mas não faz sentido minorar o problema de dinheiro do Sporting e depois utilizá-lo como argumento para as decisões, seguindo-se o incómodo quando outros argumentam com esse facto. Não vale a pena disfarçar: o Sporting tem uma situação financeira periclitante e simultaneamente teve decisões que não foram as melhores (basta recordar Demiral). Não se quer com isto dizer que houve, há ou haverá qualquer intuito menos claro. Nem sequer má gestão de ativos propositada; apenas que houve estratégias infelizes e decisões erradas. A todos toca, não é desprestígio.
Se aqui já elogiei a Direção pelo que fez e tem vindo a fazer em relação às claques, também já aqui critiquei a falta de transparência, ou melhor dizendo, a falta de assunção de problemas endémicos e graves que nos afetam. Se não podemos ter uma equipa melhor, é preferível dizê-lo a fingir que contratámos estrelas que ao primeiro jogo desiludem. Se a nossa equipa é claramente inferior à dos rivais - e é, pesem os desejos que atrás escrevi - é bom assumi-lo. Não podemos ter, como ninguém pode, sol na eira e chuva no nabal. Há que decidir qual a nossa prioridade, se vencer jogos, numa espécie de lotaria de tudo ou nada, se equilibrar o clube, incluindo revisitar e decidir sobre a maioria do capital da SAD.
Além disso, e não volto à carga sobre assunto já tantas vezes aflorado, há a questão dos estatutos, das eleições e das Assembleias Gerais. O Sporting precisa de unidade e de paz interna. Isso consegue-se, como tudo, com trabalho e dedicação. Não com distanciamento e desculpas. Penso que todos o sabemos.