CR safou-me o vácuo
HÁ alturas em que um homem começa a puxar pela cabeça e sente vácuo entre cada neurónio: zero de ideias. Quando tal me acontece, costumo passar os olhos pelo calendário para ver o que aconteceu em determinado dia de anos anteriores. Como ontem, dia de escrever estes dois mil e tal carateres, havia demasiado vácuo entre cada neurónio, fui ver o que aconteceu a 24 de fevereiro de anos anteriores. Há exatos 100 anos, por exemplo, Nancy Astor tornara-se na primeira mulher a discursar na Casa dos Comuns do Reino Unido. Sim, engraçado, mas nada a ver com desporto. Em 2008, Fidel Castro abdicara da presidência de Cuba. Estava mais perto de algo desportivo, porque Fidel chegara a jogar basebol. Mas ainda não era isto. A 24 de fevereiro nascera Alain Prost e exatos 22 anos depois, em 1977, Floyd Mayweather viera ao Mundo. Duas boas hipóteses: escrever sobre automobilismo ou pugilismo. Vi, então, que o grande Bobby Moore morrera a 24 de fevereiro de 1993. Sim, futebol. Mas faltava ainda qualquer coisa. Que tal juntar automobilismo, pugilismo e futebol num mesmo texto? Era uma ideia engraçada. Mas como? Sim, como? Ayrton Senna nunca fora pugilista, apesar de ter nascido no país do futebol. Muhammad Ali gostava de automóveis, mas nascera num país em que futebol é jogado com uma bola oval e com um capacete. Maradona marcara um golo com a mão no Mundial-1986, o que sempre me pareceu ser algo próximo de pugilismo. Porém, nunca foi fanático de automóveis e nem sequer corria muito rápido. Cheguei a pensar no velho Belarmino Fragoso, pois achei-o parecido com Alain Prost e também com Garrincha. Mas desisti. Por fim, quando o vácuo entre neurónios desapareceu por instantes, lembrei-me do óbvio: Cristiano Ronaldo. Um dos melhores futebolistas mundiais de todos os tempos, cuja velocidade de pernas o faz desaparecer entre os defesas e cujos remates, de cabeça ou com os pés, fazem lembrar socos. Mistura de Senna, Ali e Ronaldo.
HÁ quase 18 anos que CR7 anda a massacrar defesas. Primeiro como enguia. Filiforme, pegava na bola e, com ela nos pés, fintava, cruzava, rematava, assistia e marcava. Começou por marcar poucos golos, é verdade. Porém, nos últimos anos em Manchester, começou a colocar as fintas de lado e concentrou-se nos remates fatais. Foi assim entre 2008 e 2015, período em que marcou 585 golos entre clubes e Seleção. Não é erro: 585 golos em 11 épocas. A seguir ao Mundial-2018, saiu do Real Madrid e foi para a Juventus. Para o campeonato onde, dizem, é mais difícil marcar golos. Na primeira época apontou 28 em 43 jogos pelos bianconeri, média de 0,65 golos. Muito bom para 99 por cento dos futebolistas mundiais. Menos para ele. Em 2019/2020 subiu a média geral para 0,83 e 21 golos em 21 jornadas em Itália. E marca há 11 jornadas seguidas. É uma espécie de Mayweather e Prost. Ou Ali e Senna. E safou-me o vácuo que teimava em não desaparecer.