Com e sem Champions: eis a questão
FC Porto, Mehdi Taremi

Com e sem Champions: eis a questão

OPINIÃO18.03.202305:30

Ser campeão nacional vai ser a única forma de ingressar, sem riscos, na Liga dos Campeões

FIZ um simples exercício com base nas contas relativas ao 2.º semestre de 2022 das SAD dos três grandes, ainda que saiba que melhor seria fazê-lo com um ano ou época, para reduzir distorções sazonais sobretudo de proveitos ou custos de transferências de jogadores.

Benfica, FC Porto e Sporting estão hiper-dependentes das receitas da Champions e das vendas de passes. Se excluirmos as competições europeias, os custos operacionais excedem em 70% o total dos proveitos operacionais! A maior fatia vai para custos com pessoal (sobretudo plantéis e equipas técnicas) que atingem 100% das receitas correntes (sem a UEFA)!

Visto por outro ângulo - o da estrutura das receitas correntes, cf. ilustração - verificamos que a ‘Europa’ corresponde a quase metade do total (48%), com as receitas televisivas a chegar a 20% e as ‘outras receitas’ (onde estão patrocínios e merchandising) a outros 20%. Sobram 10% para as receitas de jogos (onde há diferença entre os clubes, com mais peso no SLB (15%) e menos no FCP (6%).

Percebem-se assim os severos condicionalismos num mercado exíguo, muito dependente de vendas de direitos de atletas, com a consequente ‘instabilidade’ dos plantéis e a necessidade de ‘exportação’ por via da formação.

Mas, repito, cruciais são as receitas da Champions. O dilema é o de ou se ganhar boa presença europeia, ou se terem de vender as pérolas da equipa. E, se a tal se for obrigado, necessário é refazer a equipa, até voltar aos ganhos na Europa. Nada de diferente do Ajax, que ou aparece em grande ou volta durante uns anos à incubadora de atletas.

Ser campeão nacional é não apenas o título mais possível e almejado, mas o único que, proximamente, garantirá a fase de grupos na Champions. Sim, porque voltaremos à fórmula ‘1+ talvez 1’ em vez da actual ‘2+ talvez 1’. E, neste enquadramento, há a paradoxal circunstância de os grandes estarem também dependentes das prestações de outros clubes nacionais na Liga Europa e na Liga Conferência. Por outras palavras, a estabilidade possível das suas receitas europeias depende muito da prestação de clubes mais modestos.

Em suma, um cenário que não permite - a não ser excepcionalmente - vida de rico com rendimento de remediado. Como conseguir um círculo virtuoso para evitar um círculo vicioso (ou danoso)? Eis a grande questão!
 

FOLHA SECA
Aursnes entre prosa e poesia

Aimprevisibilidade no futebol é, ao mesmo tempo, ansiedade e esperança, receio e estímulo, pessimismo e optimismo, sonho e brilho. A certeza não existe até que a incerteza se torne uma impossibilidade ou a esperança se funda com a realidade. Para o Benfica e no campeonato, ainda faltam 10 jornadas. Mas o certo é que a equipa de Roger Schmidt vem evidenciando uma capacidade, uma competência e uma autoridade que permitem crer no 38.º campeonato vencedor e fazem cair no cesto da inutilidade as palermices invejosas. E na Champions é conjuntamente com o Bayern e Man. City a equipa que ainda não perdeu qualquer jogo (12 jogos, 10 vitórias e 2 empates, 35 golos marcados e 10 sofridos!).

Uma deliciosa combinação entre o jogo associativo, o desempenho individual e o companheirismo que é visível, numa construção futebolística entre prosa e poesia.

Poderia escolher vários jogadores para ilustrar esta saúde desportiva. Mas, por agora, opto por um improvável e quase antes desconhecido eleito: Fredrik Aursnes. Nome complicado para um futebol tão inteligentemente simples, tão associativamente polivalente, tão suavemente forte, tão ofensivamente defensivo e defensivamente ofensivo, tão proficientemente omnipresente. Saiu Enzo Fernández, mas, felizmente, cá continua a melhor das aquisições do Benfica. Como já por aí se escreve nas redes sociais, o norueguês bem poderia ser definido com o título do vencedor dos óscares de Hollywood: Tudo em Todo o Lado ao Mesmo Tempo. Tal e qual, sem tiques de vedetismo, sem adereços folclóricos. Com inexcedível sentido profissional.


JOGOS FLORAIS

"Porque é que não se há-de vencer um clube mais rico? Eu nunca vi um saco de dinheiro marcar um golo"
Johan Cruyff

1947-2016

Chegar às meias é sempre possível. Cito o genial jogador neerlandês, ainda sem conhecer o próximo adversário do Benfica na Liga dos Campeões, que o leitor, quando ler este texto, poderá já saber qual é. Um sorteio com quatro ‘tubarões’ endinheirados e - surpreendentemente - três clubes italianos. Em qualquer caso, chegar ao próximo objectivo das meias-finais é sempre possível. O dinheiro só por si não dita os resultados.


FAVAS CONTADAS

20. 20 milhões de euros, a maior transferência entre clubes portugueses, embora ainda por pagar na sua quase totalidade: David Carmo. O central quase não tem jogado. Estranho, não é? E já terá o Benfica recebidos os 100 mil do mecanismo de solidariedade?


FOTOSSÍNTESE

Por cá, transmitem-se agora jogos do excitante campeonato da Arábia Saudita. Há dias, no meu costumado ‘zapping’, passei por lá. Como se pode ver na imagem, fiquei esclarecido com o resultado em língua árabe, não distinguindo que clubes estão em confronto, entre vários ‘al… qualquer coisa’. Um futebol de primeira água, jogadores de ‘fácil’ reconhecimento onomástico, outros em pré-reforma. Lá joga agora Ronaldo. Confesso que até me custa ver o nosso craque a marcar golos em versão saudita, tal como se por cá estivesse a jogar na segunda divisão. Salvo o dinheiro que recebe, pois claro…