As cidades ainda dentro dos clubes
Imagine-se um futuro no qual Benfica e FC Porto são comprados e os donos os trocam de cidade, portanto um Sport Lisboa e Benfica que passa a ter casa no Porto e um Futebol Clube do Porto com sede em Lisboa. Suponham-se até estádios novos, se tal simplificar a composição da fantasia que, aceito, é pós-apocalíptica. Qual seria o resultado das mudanças em Benfica e FC Porto? Ou doutra forma: quanto da identidade dos clubes permanece, hoje, vinculada às cidades cujos nomes ostentam?
O crescimento foi, para Benfica primeiro e FC Porto depois, também uma expansão. São clubes progressivamente mais fora dos espaços iniciais, mesmo considerando aqueles insignificantes e políticos acolhimentos nas câmaras municipais em celebração de títulos. Há uma perda de relevância das cidades dentro dos clubes, cá como no estrangeiro, de resto. Um Benfica-FC Porto na cidade do Porto encher-se-ia decerto de benfiquistas e estou convencido de que um FC Porto-Benfica em Lisboa também poderia apinhar-se de portistas - talvez mais facilmente ocorresse o primeiro, em todo o caso. E em jogos que não clássicos que diferenças teríamos? Resistiriam ambos à mudança? Só o Benfica? Nem o Benfica? Quem achar estimulante o exercício, que o debata antes do jogo desta tarde, por exemplo.
Na vida que existe, aquela que não temos de imaginar, lembremo-nos do que penam os adeptos dos Oakland Raiders, equipa da NFL que na próxima época vai mudar-se de Oakland para Las Vegas. Pelo estádio em Oakland andam, fantasmagóricos, seguidores de uma equipa que vai mudar-se para uma cidade a 900 km. Ficarão constrangidos a uma ligação quebradiça, a um amor à distância, uma tentativa que toda a gente reconhecerá entregue ao fracasso. O Benfica é de Lisboa e o FC Porto é do Porto. Mas já não tanto como antes.