‘And now the end is near’

OPINIÃO10.05.201804:00

A conjuntura putrefacta gera desabafo conjuntural 
 
De acordo com o que pode ser asseverado por muitos milhões de testemunhas oculares, nelas se incluindo espetadores e telespetadores, o futebol, enquanto jogo, ainda existe. Às vezes, todavia, não parece. No rescaldo de cada partida, como sabemos, o jogo só aparece em apontamentos episódicos, intimidado em curtos istmos abertos, quais clareiras, nos discursos feitos de azia. São as patologias que colonizam, à velocidade da luz, todos os comentários institucionalizados, que vão desde a flash interview até às aguardadas conferências de imprensa e que se espalham, de seguida, tipo epidemia, pelos debates que ocupam longas horas de espaço televisivo e radiofónico. Comparado com o que se passa antes de se iniciar, nos famosos túneis ao intervalo e depois do silvo final, o pobre joguito surge vivamente empalidecido no tratamento que leva e no interesse que desperta. Com mais ou menos cartilha, ou com mais ou menos polimento, os porta-vozes oficiais e oficiosos dos clubes, a par dos adeptos independentes que se juntam a cada um dos exércitos em presença, consomem-se na escalpelização dos factos anómalos, para os quais, regra geral, há sempre uma explicação de caráter conspiratório radicada, por vezes, em sofisticados silogismos e noutras em truísmos de trazer por casa. Pelo meio de tanto vozear há muito gente com razão e outra gente com défice da dita. Deus me livre de pôr em causa a liberdade de expressão e/ou as escolhas editoriais dos media. Era o que faltava. Todavia, como fenómeno em análise, a coisa não deixa de impressionar. A título de exemplo vejam-se estes melancólicos apontamentos: tivemos, no passado fim de semana, dois clássicos com grande impacto em Portugal. O Sporting-Benfica à cabeça, claro está, mas, igualmente, o Barcelona-Real Madrid. Na Catalunha, com o perfume do jogo feito à base das melhores essências do mundo (Messi e Ronaldo), do que mais se falou afinal? Da recusa do Real em fazer o tal pasillo em saudação desportiva ao anfitrião campeão; dos ralhetes à equipa de arbitragem ao intervalo, na sequência da expulsão de Sergi Roberto e, para não variar, da arbitragem do jogo em todo o esplendor do desastre que foi. Lá está: a arbitragem foi um verdadeiro rol de máculas. Mas, caramba, houve um golo fabuloso (Bale), houve vários génios em campo e o jogo, liberto de grandes amarras táticas, até teve uma graça especial. Não há cantigas de amigo, reinam as de escárnio e maldizer. E por cá a coisa não foi muito diferente. Mal acabara o jogo, já o habitualmente circunspecto e comedido treinador do Benfica se atirava, como gato a bofe, a Carlos Xistra e seus auxiliares humanos e cibernéticos. Esmiuçada a coisa, concluiu-se, após as farpas lançadas à equipa de arbitragem, que, afinal, existira um penalty e perdoado ao Benfica e uma agressão impune, perpetrada sobre Gelson. O peixe voltou a morrer pela boca, como é seu destino trivial. Noto que, neste desabafo a que me entrego, nem sequer curo muito de saber se o juiz albicastrense esteve melhor ou pior do que a média estatística nacional. Legitimidade para se queixar terá, acima de tudo, Gelson e, precisamente, o seu queixo. Gostaria de ter ouvido a aceitação do resultado, como decorrência normal das vicissitudes do jogo. Mas isso é impossível. Estamos no final da época, as emoções estão ao rubro, o futuro é incerto e, fazendo jus ao bélico dizer, que deveria estar proscrito do desporto, em tempo de guerra não se limpam armas, nem se reconhecem erros. Este ambiente não parece ter regeneração à vista. Pelo contrário: apresenta-se cada vez mais acrisolado. É pena. Deveríamos sintonizar com o sábio Juvenal, quando preconizava uma alma sã em corpo são e colocar o desporto na senda dos ideais olímpicos que celebramos fidelíssimos, mas que somos incapazes de viver. Será isto uma irreversibilidade? Espero que não. 
 
Voltando à terra 
 
O campeonato já tem um vencedor que é o Futebol Clube do Porto. Dou-lhes os meus parabéns. Fico triste por terem ganho. Gostaria que tivesse sido o Sporting a subir ao topo do pódio. Mas não foi. Deixo uma palavra de reconhecimento ao Sérgio Conceição que teve uma estreia premiada. Pareceria que, com as derrotas em Paços de Ferreira e em Belém, a coisa teria ficado hipotecada. Porém, apesar dos pirolitos bebidos, pronuncio de afogamento, soube conduzir a equipa da perspetiva do naufrágio para um decisivo resgate operado no Estádio da Luz. Bateu-se pelo sucesso e conseguiu. Por isso justifica a felicitação. Dados os parabéns, regresso ao que me interessa, isto é, a luta pelo segundo lugar. A incerteza aguça muito o interesse da última jornada. Pela minha parte, confesso-o, estou muito confiante. A equipa tem seguido um trilho vitorioso, descontando o empate com o Benfica, trilho com o qual cauciono a minha expectativa. E, na parte que me toca, neste momento só este assunto interessa, a par com a vitória na Taça de Portugal, com a qual espero que fechemos a época. Fechada que seja a época, haverá tempo para abordar alguns aspetos periféricos que nos são dados a assistir, os quais têm feito, merecidamente, correr muita tinta, mas que, por ora, deverão ser secundarizados em face dos superiores interesses do clube. Desejo ao meu amigo Jorge Jesus e a todo o grupo as maiores felicidades. Que no domingo nos proporcionem, a partir da Madeira, a alegria merecida da via verde para a Liga dos milhões. 
 
Rui Patrício
 
Não sei se fica, não sei se sai. Sei que gostaria muito que ficasse. O Rui é a incarnação viva do que de melhor há no desporto. Junta, na mesma pessoa, uma transcendente capacidade desportiva e uma evidente qualidade humana. Gostaria que viesse a ser o nosso Buffon, ele que é, em síntese perfeita, um símbolo do clube e um esteio do amor ao clube. É um luxo termos nas nossas fileiras um dos melhores guarda-redes do mundo, que, para felicidade de todos, é do Sporting e ama o Sporting. Não admira nada que o cobicem. Pudera. Mas, insisto para memória futura, gostaria muito que ficasse.