Águia, tens de voar mais alto

OPINIÃO11.09.201904:00

ALEMÃES do RB Leipzig na Luz na terça-feira. É o primeiro jogo do Benfica na sua 15.ª participação na Liga dos Campeões, o modelo competitivo que sucedeu ao da antiga Taça dos Campeões Europeus no verão de 1992. Como é público, não tem sido famoso o desempenho da águia nesta competição super elitista, embora seja absolutamente verdade que o Benfica continua a ter  pinta de grande europeu noutros aspetos que não os resultados na Champions: estádio espetacular quase sempre cheio, enorme e fiel massa de adeptos, centro de formação de nível mundial, grandes receitas com vendas de jogadores, presença muito forte nos centros de influência, poder e decisão.

Mas é mais que tempo de o Benfica deixar de viver dos feitos e glórias longínquas - o último triunfo europeu aconteceu há 57 anos (1962), o ano do crise do mísseis em Cuba - e tentar recuperar uma posição mais consentânea com o seu historial. Luís Filipe Vieira sabe que a incapacidade de afirmação na Champions é a grande pecha do seu longo mandato, como sabe que um grande europeu nunca é grande só de trazer por casa (apenas para brilhar nas provas domésticas). Também o treinador Bruno Lage, atualmente a voz mais lúcida e desempoeirada do benfiquismo, já mostrou em várias declarações avulsas que está disposto a olhar para a Champions como um objetivo prioritário e não como um entrave à competição doméstica que interessa - o campeonato (erro que o FCP nunca cometeu, honra lhe seja feita). Julgo que Lage tem a noção que nenhum clube pode dizer que é grande se não consegue afirmar-se na verdadeira prova dos grandes. Uma boa maneira de começar a recuperar terreno é passar mais vezes da fase de grupos do que não passar - aquilo que tem sido a triste rotina benfiquista. O resto virá com o tempo e a experiência.    

No antigo formato, que durou 37 anos, o Benfica foi um gigante, como todos sabemos, uma das poucas equipas europeias capazes de marcar uma era, no decurso da qual atingiu cinco finais (entre 1961 e 1968), ganhando as duas primeiras; a era de Eusébio & Coluna, cabeças de cartaz de um onze fabuloso que era o orgulho do país e da lusofonia. Se no modelo antigo o Benfica foi um dos grandes europeus de facto - realeza pura ! - e o porta-estandarte de Portugal além-fronteiras, no formato Champions (cuja estreia em em 1992/1993 coincide com o início da hegemonia portista e consequente crise encarnada), o clube lisboeta nunca sequer se aproximou desse estatuto, pesando hoje muito pouco no contexto continental. Repare-se que em 14 participações o Benfica só por cinco vezes passou da fase de grupos e nunca foi além dos quartos de final (o pequeno Mónaco, por exemplo, chegou a uma final e a três meias-finais desde 1994); além de registar mais derrotas (41) que vitórias (35) e mais golos sofridos (136) que marcados (105). É um contraste brutal com a competitividade e a classe exibidas pelo Benfica entre as décadas de sessenta e oitenta do século passado. Eu ainda vi muitos jogos europeus do Benfica nos anos setenta e oitenta - quando o inferno da Luz fazia tremer quase todos os visitantes - e sei muito bem qual é a diferença. A águia dantes imperial hoje voa demasiado baixinho para o tamanho do clube - e da sua história. É verdade que os anos de Jorge Jesus foram muito bons, mas na Liga Europa (uma meia-final e duas finais). Na Champions o clube continuou a não conseguir afirmar-se, só muito ocasionalmente batendo o pé aos grandes (em 2006, vitórias sobre Manchester United e Liverpool com Ronald Koeman) e muito raramente passando da fase de grupos, quando essa devia ser a regra.

Voltando ao RB Leipzig do voraz Timo Werner. Será porventura a equipa mais forte do grupo e aquela que convinha ao Benfica vencer na Luz para ganhar confiança e uma boa embalagem para os confrontos seguintes - Zenit na Rússia (a 2 outubro) e Lyon (na Luz, três semanas depois). É claro que não estamos a pedir ao Benfica que ganhe a Champions,  apenas que cumpra os mínimos que o FC Porto costuma cumprir há mais de 25 anos. É preciso ter em mente que o campeão português, seja ele qual for, está hoje muito distante dos grandes de facto. Pensem nos avançados do Benfica, Seferovic e Raul de Tomas: acho que muito dificilmente se sentariam no banco de uma das equipas de topo. Alguém está a vê-los serem escolhidos por Liverpool, Barcelona, Juventus, Manchester City, Bayern, Real Madrid?

O que se pede ao Benfica é que volte a ser grande dentro das possibilidades atuais. E ser grande para um campeão português é passar da fase de grupos quando não houver dois tubarões (como aconteceu ao Sporting de Jorge Jesus em dois anos consecutivos: primeiro, o Real Madrid e o Dortmund; depois o Barcelona e a Juventus). No grupo do Benfica, que parece bastante equilibrado, não há tubarões, apenas equipas da classe média, média-alta. Portanto…