Abriu a caça ao árbitro
Não se sabe quem, em Portugal, teve a infeliz ideia de fazer do VAR não um auxiliar do árbitro, mas, de cada árbitro, um auxiliar do VAR
O árbitro, em Portugal, é uma espécie em vias de extinção. Claro que há quem escolha a arbitragem com o firme propósito de ganhar o que nunca ganharia na sua profissão, mas até mesmo alguns desses se interrogam: «Mas será que vale a pena?» A troco de mais umas centenas de euros, vale a pena a angústia, a desvalorização humana, as ameaças que envolvem património e família, a condenação, na praça pública, por gente que não tem moral, nem para estar calada, o desrespeito ético, a noção de que os poderes políticos e judiciais se estão nas tintas para o que se passa e até incentivam os marginais pela demonstração óbvia da impunidade?
Não há, sequer, pequenos sinais de melhoras de uma situação que nos coloca, desportiva, social e culturalmente entre os mais medíocres seres humanos da Europa. Dirão aqueles que nunca quiseram verdadeiramente resolver fosse o que fosse, e sempre se agacharam perante os nossos venerados Donos do Futebol, que a culpa é de todos. Falso. A culpa não é, nem nunca foi de todos. A culpa tem nomes e todos os conhecem, a começar por aqueles que têm o dever de Estado de ter a coragem de resolver.
Todos os anos, mais ou menos por estas alturas dos idos do inverno, abre a caça aos árbitros. É a caça preferida dos desesperados, daqueles que esbanjam milhões, engravidam de dívidas os seus clubes e sociedades desportivas e que, jogando na roleta, querem ganhar sempre. Porque precisam de sobreviver. Porque sabem que podem contar com um exército de irracionais e de fanáticos para os proteger e para os entronizar.
Triste país que teimosamente vive, ano após ano, esta demência grotesca, que nos afasta do mundo moderno e nos faz regressar à vida selvagem dos homens das cavernas, criando inimigos imaginários e inventando razões de vitimização que cirurgicamente lhes desculpabilizam erros fatais e privilégios inconfessáveis.
E, no entanto, são esses, por enquanto, aqueles que triunfam pelo alarido e pelo ruído, calando os poucos, mas corajosos exemplos, daqueles que silenciosamente lutam, verdadeiramente, pela evolução do jogo e pelo sucesso da indústria do futebol.
P OR falar em evolução do jogo. Supostamente, o VAR teria aparecido no futebol como um instrumento essencial a uma mais íntima relação do futebol com a verdade desportiva. Um auxiliar essencial à frágil condição humana do homem-árbitro. Pelo que se tem visto, há quem considere o VAR um projeto falhado, gerador de mais discussão, de mais descrédito, de mais razão de desconfiança. É injusto pensar assim. Mais: é errado pensar assim. O VAR é um instrumento e não tem culpa de quem o opera. Se me derem um bisturi, arrisco-me a matar o paciente, logo no primeiro golpe. E a culpa seria do bisturi?
O VAR veio para ficar e, em muitos países, está a ser bem utilizado e, por isso, é útil. Só não se sabe quem, em Portugal, teve a infeliz ideia de fazer do VAR não um auxiliar do árbitro, mas, de cada árbitro, um auxiliar do VAR. É um erro tão evidente que quase parece impossível que os responsáveis pela arbitragem portuguesa não vejam e não corrijam.
Aliás, a forma desproporcionada como o VAR tem sido usado por cá está a viciar os jogadores que, cada vez mais, jogam com o grito e com a simulação da falta. Eles sabem que, sendo o futebol um jogo de contacto, podem tirar partido de qualquer toque para condicionarem o árbitro, que tem medo que o VAR os desminta na análise. Porém, o futebol nunca poderá dispensar a realidade vivida no próprio jogo.
O comentário sexista de Mori
O presidente do comité organizador dos Jogos Olímpicos de Tóquio, o antigo primeiro-ministro japonês, Yoshiro Mori, não aguentou a pressão que as suas declarações públicas causaram, depois do comentário sexista em que considerava as mulheres «um incómodo» por falarem de mais e, por isso, fazerem demorar as reuniões executivas. Além de sexista, o comentário é injusto. Basta olhar para a realidade portuguesa onde tantas reuniões só de homens demoram eternidades, porque todos gostam de ter palco para falarem.
O livro é um amigo essencial
Em tempo de confinamento, o livro é um amigo essencial. Não é um acessório dispensável e, muito menos, um luxo intelectual. O livro é um ponto de apoio, um farol que indica um porto seguro, no meio da tempestade que se abate nas nossas vidas. Criar condições para voltar a vender livros é, pois, uma obrigação do Estado e, por isso, celebre-se a intenção do Presidente da República em emendar o que, manifestamente, estava errado. Ler ainda é uma fuga para o lado mais luminoso da vida. Ler, neste tempo de isolamento, é liberdade.