A televisão é um repto
NOS dias que correm, o futebol é o prato do dia em nossas casas. A oferta (?) é variada e permite-nos aceder a jogos do nosso campeonato e de todos os que consideramos mais importantes.
Essa abundância reforça uma certeza, para mim, muito clara: a de que a realidade que as imagens mostram pouco tem a ver com aquela que, verdadeiramente, se sente e vive em campo.
Só não terá essa noção quem nunca jogou futebol, quem nunca viu um jogo bem de perto (juntinho à relva) ou quem não tem a mínima noção prática do espetáculo que tanto diz gostar e admirar.
Para esses, fica a garantia: a televisão tem o mérito enorme de apurar a definição, o detalhe e a velocidade das incidências, mas jamais conseguirá transmitir, fielmente, o sentimento, a dinâmica e a intensidade de tudo o que se respira e saboreia ao vivo.
O jogo que se vê no estádio tem cheiro, som e essência. Tem humanidade total. O jogo que os frames reproduzem não. Tem outra matriz, mais laboratorial e analítica. Mais técnica. Mais mecânica.
As coisas são como são e isso não belisca, nem um bocadinho, a importância tremenda que a caixinha mágica teve (e continua a ter) na divulgação, promoção e, sobretudo, crescimento exponencial deste produto.
A mensagem que aqui se pretende passar vai no sentido de recordar o caro leitor - também assíduo telespectador - que deve equacionar essa diferença quando vê e analisa um jogo no conforto da sua poltrona.
A área onde isso se torna mais evidente diz respeito à análise que faz dos lances. À opinião que forma em relação a acertos e erros das equipas de arbitragem.
A TV tem esta característica complicada: mostra dois braços nas costas, o que leva à dedução que pode ter havido empurrão; amplia a imagem de um toque num pé, o que faz depreender que terá existido rasteira ou pontapé; foca, com precisão, em dois braços sobre um corpo e parte-se do princípio de que terá havido agarrão.
Essa ilusão de realidade (às vezes é verdade, às vezes não), suportada na impossibilidade que a TV tem em medir a intensidade de um choque ou contacto, leva-o tantas vezes a julgamentos sumários sobre a competência ou, até, idoneidade dos homens do apito.
O repto que hoje tenho para si pode contribuir para uma mudança radical de atitude. É um pequeno esforço para um grande objetivo:
- Sempre que um lance não for absolutamente claro e evidente, sempre que uma infração deixe margem para dúvidas, sempre que uma jogada seja mais dúbia ou cinzenta... porque não aceitar, como boa, a decisão que o árbitro tomou?
Se o erro não foi grosseiro, se a decisão não foi escandalosa, se a escolha levanta interrogações... porque não dar-lhe o benefício da dúvida?
Tem noção de quanto essa mudança de chip - se acompanhada por quem tem responsabilidade e voz ativa na indústria - pode influenciar, positivamente, o estado das coisas?
Vá, pense nisso. As grandes mudanças acontecem assim. Com simplicidade. E esta depende inteiramente de si.