A Seleção Nacional como reserva ‘moral’
A Seleção é cada vez mais a reserva moral de um futebol português cujos clubes estão cada vez mais fraquinhos e menos competitivos em termos internacionais. Como se viu na semana passada, em que as nossas duas melhores equipas foram varridas sem grandes dificuldades por adversários de segunda e terceira linha europeia. Podemos embirrar com o estilo e a ideia de jogo de Fernando Santos e dizer que ele, aqui e ali, podia ser mais ousado e afirmativo tendo em conta o estatuto e os títulos ganhos pela Seleção (ganhos por ele e com a ideia de jogo dele, não se esqueça o detalhe); o que não podemos ignorar é que a Seleção de Portugal é, nos últimos largos anos (sobretudo os que correspondem à era do engenheiro), a única equipa portuguesa que joga de olhos nos olhos com as potências do futebol e a única que se tem mostrado capaz de ganhar competições internacionais (não quero ser injusto com o FC Porto, que ganhou brilhantemente quatro títulos internacionais no hiper-elitista futebol do séc. XXI com duas equipas e três treinadores diferentes - José Mourinho e Víctor Fernández em 2003 e 2004, André Villas Boas em 2011-, mas parece-me que o FCP atual está muito distante desses tempos, embora continue a ser a nossa única equipa com capacidade para fazer boa figura na Champions - como se tem visto).
O futebol desta Seleção pode não ser apelativo e entusiasmante como o de outras seleções do passado recente - não é; mas a verdade é que ganha títulos, raramente perde jogos, não falha qualificações e chega quase sempre longe nas fases finais. Se mesmo assim parece pouco, então é porque a memória coletiva é tão fraquinha como foi o futebol do Benfica com o Lyon e o do FC Porto com o Rangers. Lembro que entre o Europeu de 2000 (Humberto Coelho) e o Mundial de 2006 (Luiz Felipe Scolari) o espetacular Portugal de Figo, Deco, Rui Costa e Pauleta jogou como nunca… e perdeu como sempre - como haviam perdido os Magriços em 1966 e os Patrícios em 1984. Concertos de bem jogar invariavelmente finalizados com lágrimas, suspiros e dores, muitas dores e algumas particularmente difíceis de suportar - como a brutal picada grega na Luz. Foi por um bocadinho…
Portugal prepara-se para assegurar a qualificação para o atípico Europeu de 2020. Precisa de ganhar à Lituânia e ao Luxemburgo e todos acreditamos que vai conseguir. Será a 13.ª fase final consecutiva para a única - única ! - seleção europeia que não falhou uma única qualificação no séc. XXI. Lembro que a Alemanha, a Espanha e a França falharam a final four da primeira Liga das Nações (ganha por nós); a Inglaterra falhou o Europeu de 2008 e a Itália falhou o Mundial de 2018 e a Liga das Nações. Já a Holanda e a Croácia falharam cada qual três fases finais desde 2000. Se isto não é suficiente para percebermos - e valorizarmos, caramba! - a posição da Seleção de Portugal no contexto atual, atente-se no quadro em anexo que resume o desempenho das maiores potências europeias desde a viragem do milénio. Portugal é claramente uma seleção de topo, com dois títulos (a Itália tem um, por exemplo), o segundo maior número de jogos (153, como a Alemanha) e a quarta com mais jogos ganhos (93) e golos marcados (307), atrás da Espanha, Alemanha e Holanda. Eu gosto de números e estatísticas por isto: indicam factos irrefutáveis (o futebol vive de resultados, lembram-se?) e ajudam-nos a perceber padrões e tendências. A Seleção, goste-se ou não do estilo do engenheiro Santos, está muitíssimo acima do que o país vale em termos clubísticos.
Eu sei que há muita gente que, por motivos diversos (clubite e outras embirrações incluídas), diz que não tem pachorra para a Seleção e finge que não vê os jogos, quando muito «dá uma espreitadela». Ainda poderia compreender isso nos anos setenta, oitenta ou noventa, quando Portugal era uma equipa de segunda ou terceira linha que jogava poucochinho e nunca se qualificava para nada. Mas agora?
A Seleção é, de longe, a melhor equipa de futebol portuguesa - e a única de classe mundial.