A rota para o sucesso
‘Ich bin ein berliner’
Na época transacta o FC Union Berlin, clube alemão fundado em 20 de Janeiro de 1966, conquistou o direito a estrear-se na Bundesliga. Para o seu primeiro jogo, em casa, foram vendidos 22.467 bilhetes. Todavia, a capacidade máxima do estádio Alten Foersterei é de 22.012 pessoas. Como explicar então os 455 excedentes? Aconteceu simplesmente que o clube instituiu uma original campanha que consistia no seguinte: quem adquirisse um bilhete extra receberia em contrapartida um cartaz, impresso pelo próprio clube, com o nome e a foto de algum parente que tivesse morrido sem chegar a ver o emblema do seu coração jogar na Bundesliga. Resultado: um comovente mar de fotos a preto e branco cobriu as bancadas. E foi assim que, num estádio de futebol, os mortos deram vida ao futuro.
O homem que não era burro
O novo Canal 11 transmitiu um programa em que Vítor Baía esteve à conversa com o antigo selecionador nacional e actual treinador do Palmeiras, Luiz Felipe Scolari. De uma forma polida, o antigo guardião foi directo: «Não podemos deixar de colocar a questão que vale um milhão de euros, que tem a ver com a minha não convocação para o Campeonato da Europa de 2004.» Resposta fulminante, mas de forma alguma surpreendente, daquele a quem chamavam Sargentão: «Era uma opção minha. Um técnico chega a um país e muitas vezes é cercado por pessoas e não tem o conhecimento completo da cultura. Aí faz algumas escolhas.» Palavras claríssimas, mistério resolvido. Mas o brasileiro - que tinha por hábito perguntar se o burro era ele - insistiu em administrar nova dose de transparência: «Não foi por isto ou aquilo. Eu fiz a minha opção e escolhi aquele caminho. Naturalmente, se tivesse de escolher mais tarde, quem sabe eu tivesse feito outra.» Esqueceu-se só de dizer que fez mesmo outra, tendo chegado ao ponto de convocar o então terceiro guardião portista (Bruno Vale), que ele não conhecia de lado nenhum. Concluindo: «Não é uma situação que vamos ficar a remoer, amargurados para o resto da vida.» Mas «vamos» quem? O algoz, a vítima ou ambos?
Os dorsais e os nomes
Por regra, todos os equipamentos desportivos, nomeadamente nas disciplinas colectivas, ostentam um número, conste este da frente ou das costas, seja ele aposto em camisetas de alças, como no basquetebol, ou em pólos de mangas compridas, como no râguebi. Só nunca percebi porque é que no ciclismo os atletas não envergam números mas dorsais. E eu a pensar - mal, já se vê - que dorsal era, em geral, a parte posterior do corpo humano relativa às costas, ou a referente, em particular, às doze vértebras situadas no meio das costas, entre as cervicais e as lombares.
Da Guiné
à Colômbia, através
do México
e da Rússia
1. O último jogo da Luz constituiu não só o mais fácil para o dorsal 32 (Marchesín), como foi o primeiro de dragão ao peito em que o guarda-redes argentino não teve de fazer qualquer defesa de verdade. Aliás, em 90m a equipa benfiquista só por 2 (duas !) vezes logrou visar a baliza portista (contra os 9 remates dos azuis e brancos...). Em contrapartida, o grego Odysseas foi, e de muito longe, o melhor jogador do Benfica. O que não deixa de ser irónico para quem esteve putativamente remetido ao banco dos suplentes em detrimento de um crónico substituto italiano quase sempre incapacitado…
2. Os 90 e tal minutos do clássico poderiam, sem golos, ser resumidos em exactamente 112 segundos, ou 1m52s, conforme se queira: jogada iniciada pelo dorsal 16, Uribe, bola tocada, pelo menos uma vez, por todos os 11 membros do colectivo, num total de 87 toques e 44 passes certos até à perda do esférico pelo dorsal 3, Pepe.
3. A rota para alcançar o sucesso estava bem assinalada no mapa de trabalhos do Dragão. O percurso selecionado obedeceu a um critério claro e objectivo: andar depressa mas sempre em segurança. E também, claro, sem medo. Porque quem tem medos acaba por travar mais do que acelerar.
4. À partida para esta prova o team dragoniano sofria de duas fragilidades, traduzidas em dificuldades adicionais: a penalização com que fora castigado na primeira etapa, corrida em Barcelos, e o violento acidente provocado por uma obscura equipa russa. Tudo isto sem considerar já que, sendo uma prova crucial, decorria a mesma praticamente logo a abrir a estrada. A isto há ainda que somar a circunstância de mais de metade (ou seja, seis em onze) dos membros da tripulação ser nova e sem experiência deste tipo de competições. E casos houve em que foi até necessário chegar a mudar de pneus sem sequer parar.
5. Recapitulemos então, de modo sumário, como decorreu a prova. Tudo começou pelo meio, onde se plantou uma muralha, móvel mas inexpugnável, que surpreendeu o adversário, desde logo, pela respectiva composição: uma primeira metade luso-guineense (dorsais 8, Romário, e 22, Danilo) e uma segunda colombiana (dorsais 16, Uribe, e 7, Luis Díaz). Atrás desta trincheira, um comandante (dorsal 32, Marchesín, proveniente do México) calmo e sereno, rápido e ágil como um felino entre os postes, voador fora deles e, muito importante, um exímio mestre de cerimónias como selector das jogadas a conceber, qual pivô, partindo de trás e fazendo uso do seu magnífico jogo de pés. Finalmente, na frente de batalha alguém que se fez matador em Portugal e que nos últimos anos lidou nas gélidas estepes russas - o dorsal 20, Zé Luis.
6. Ao exposto sublinhe-se ainda que o FCP nem no banco pôde contar com os dorsais 10, Nakajima, e 27, Sérgio Oliveira…
7. Mas assim como fica bem tudo quanto acaba bem, também o anfitrião não perdeu a compostura e as boas maneiras só por ter perdido um simples jogo de futebol. Na verdade, é justo assinalar que, desta vez, não houve nem luz apagada nem relva regada. Houve, apenas, a delicadeza de tocar o hino da casa com o volume no máximo para, como será natural, abafar os absolutamente insuportáveis cânticos portistas.