A razão de Jesus

OPINIÃO10.08.202107:00

A entrada na Champions é prioritária, por ser decisiva não só do ponto de vista financeiro, mas também para recolocar o Benfica no lugar que o seu passado impõe

JORGE JESUS fez muito bem em colocar o acento tónico na  Champions assim  que regressou da viagem a Moscovo. Os adeptos gostaram e os jogadores mais ainda, por ser nesse palco de estrelas que se querem exibir e valorizar, principalmente os mais dotados. Além de ter entrado em oportuna sintonia comunicacional com Rui Costa, o presidente, o qual, como escrevi há uma semana, neste espaço, foi o autor de  uma frase que mereceu o aplauso de toda a família da águia, ao proclamar que um clube com a dimensão do Benfica «não pode  estar fora da Liga dos Campeões».
Foi importante também por  estender os horizontes da equipa, não só para fazer esquecer o desastre desportivo da época anterior, mas também para dar um sinal de ambição renovada no dealbar da atual, mantendo viva a força de acreditar.
É assim nos grandes emblemas:  constante exigência máxima para manter infindas as perspetivas de sucesso. E o Benfica continua a ser identificado internacionalmente como um dos maiores. Foi o que levou Lucas Veríssimo, um jogadorzão em potência, a tomar a opção que tomou, não para estacionar no campeonato luso que pouca visibilidade lhe dá, mas servir-se dele como paragem intermédia até adquirir bilhete de ingresso numa dos principais ligas europeias. Nem o internacional ucraniano Yaremchuk, Roman para os amigos,  teria aceitado, sem reticências,  mudar-se para a Luz se não tivesse recebido de Shevchenko ordem para avançar, por solicitação de Rui Costa, nem o Benfica teria contratado Meité sem antes Rui Costa escutar a opinião favorável de Paolo Maldini, como é noticiado em A BOLA. Sinais de tempos novos…
Hoje, o povo benfiquista regressa à Luz e quer comemorar a vitória na terceira pré-eliminatória com o Spartak e o consequente apuramento para o play-off,  diante do PSV, que é igualmente para vencer. Depois, na fase de grupos, acrescentam-se os respetivos milhões e a conveniente boa figura que é preciso fazer. Entretanto, no plano interno, aí sim, é jogo a jogo, sem necessidade de  um desenho,    para ir ganhando e somando pontos de maneira a garantir lugar no topo da classificação até à vitória final. Conta mais simples é impossível… 
 

Jorge Jesus, treinador do Benfica

SE Sérgio Conceição disser que quer deixar marca relevante na Liga dos Campeões já ninguém lhe pergunta se essa intenção poderá prejudicar o desempenho da  equipa portista na Liga portuguesa, por ser habitual a presença proeminente do FC Porto  nessas duas frentes. Estamos a falar de competições incomparáveis e de temas muito distintos. Foi assim com o Benfica entre as décadas de sessenta e de noventa do século passado, é assim com o FC Porto neste século, tal como os anos  recentes, correspondentes ao consulado de Conceição, testemunham com  fidelidade. São duas realidades que não se atropelam, pelo contrário, enriquecem-se quando enquadradas nas devidas proporções.  
Com Jorge Jesus, porém, é diferente, por se ter embrenhado tempo demasiado nas querelas de bairro em defesa das suas ideias e das suas competências. Apesar de neste país pequeno, no tamanho  e na mentalidade, se pensar bem acerca do que ele é como treinador, a verdade é que demorou até perceber que isso conta pouco nos centros de decisão dos mais poderosos clubes europeus. Talvez   continue sem perceber, razão pela qual o seu atrevimento foi  recebido com surpresa pelos jornalistas e ele, em vez de  cortar pela raiz as perplexidades que a sua posição gerou, acertada, do meu ponto de vista, acabou por dar o dito por não dito, mais ou menos isso.

REPROVO as suas gabarolices, mas desta vez não foi o caso. Tão somente, faltou-lhe firmeza  para defender a sua opinião, reforçando que a entrada na Liga dos Campeões é prioritária, por ser  decisiva não só do ponto de vista da estabilidade financeira, mas também para recolocar o Benfica no lugar que o seu passado impõe.
Preferiu travar a fundo e enveredar por afirmações banais e indiciadoras de quem não se sentia seguro. Respaldou-se nos resultados fisiológicos para justificar as alterações introduzidas na equipa em Moreira de Cónegos, mas não explicou o porquê de tanta gente à beira de esgotamento nesta fase embrionária da temporada, assim como devia ter evitado a referência inútil ao calendário e que o  portista Vasco Correia satirizou com imensa graça, anteontem, na página dos Amigos d’A BOLA: «Urge acabar com esta mania de se marcarem jogos sem pelo menos dois meses e meio de intervalo e aviso por carta registada.»
Dito de outra forma, haverá algum treinador de clube médio/grande da Europa que não esteja obrigado a jogar duas ou três vezes por semana?
Como reza a sabedoria popular, Jesus perdeu uma boa oportunidade para ficar calado, ou, simplesmente, sublinhar o que havia dito e eleger a participação na Champions como primeiro objetivo da época e a conquista do Campeonato como segundo, sem necessidade de explicações adicionais, nem definição de graus de importância.   Ontem, irritou-se com uma pergunta e pediu para se deixarem de brincadeiras. Também tem  o direito de indignar-se…