A classe da águia e a tarimba do dragão

OPINIÃO16.04.201901:09

Quando  faltam cinco jornadas para o termo do Campeonato os dois principais candidatos ao título não dão sinais de fraqueza.  E são principais   porque, em rigor, há mais dois ainda com candidaturas pendentes: a do SC Braga, que vai receber o Benfica, e a do Sporting,  por estar mais perto dos da frente e ter a oportunidade de na derradeira  ronda visitar o  dragão e… vencê-lo.
Este exercício tem algum cabimento  unicamente em função da proximidade pontual  entre quatro primeiros da classificação, mas ninguém admite  a possibilidade de reviravolta tão significativa no pouco que falta cumprir.  É verdade que sportinguistas e braguistas podem interferir na contagem final, mas as atenções continuam centradas no ombro a ombro que benfiquistas e portistas galhardamente mantêm, sem emergir  neste exato momento, e do meu ponto de vista, indício que permita  arriscar  com o mínimo de fundamento qual deles  evidencia mais argumentos para terminar a prova no primeiro lugar.
O que se observa, sim, é um debate interessante entre dois estilos de  futebol:

FC Porto, mais compacto, robusto,  adulto e musculado, mas menos estético e imprevisível,  alicerçado em estrutura consistente e reforçada  ao longo de quase dois anos de trabalho orientado para um determinado conceito que, por sua vez,  reflete uma identidade diferenciadora. Por isso se diz  que o Porto é o único com envergadura europeia.
Construiu  e valorizou uma imagem de marca que o torna temido por ser capaz de fazer muito com pouco. Além de atribuir muito valor a cada golo que marca e detestar  que os adversários desfrutem  de idêntico prazer, motivo por que   é a partir de trás,  da solidez da organização defensiva,  que o seu futebol flui. Encorpado e de grau forte para apreciar com prazer e  moderação. Como alguém me resumiu: pode não deslumbrar, mas raramente compromete.

Benfica, mais  irreverente, agradável, elaborado e belo, mas menos agressivo e combativo,  sequelas de  passado recente que as novas  e elogiadas dinâmicas de Lage ainda não diluíram por completo.  Mais instável  também, por apostar na elegância exibicional em detrimento de sacrifícios vários  que a alta  competição reclama sempre, independentemente do nome do oponente. De aí falar-se de equipas equilibradas, que  funcionam em bloco e a  uma só voz e de outras em que a uma  forte tendência  finalizadora não corresponde a necessária segurança defensiva. Creio que o Benfica integra este grupo , frenético, empolgante e  com sentido de baliza,  mas sem conseguir mostrar colheita para tamanha produção goleadora.  
A talho de foice, até parece que, de repente, se tornou fácil  marcar golos ao Benfica. Nem falo nos que sofreu diante do Eintracht para a Liga Europa, na sequência  de falhas graves, de Fejsa, Jardel e Vlachodimos. Fico-me pelo que permitiu ao Feirense, um lapso de comunicação reprovável,  e pelos que consentiu ao Vitória de Setúbal:  num faltou gente, noutro faltou cuidado.

A diferença mais significativa entre águia e dragão, porém, mede-se pelas políticas desportivas que cada  emblema defende:  na última jornada, o Benfica apresentou sete titulares portugueses (André Almeida, Rúben Dias, Ferro, Pizzi, Florentino, Rafa Silva e João Félix - 64%), utilizou mais um (Jota) e teve no banco dois não utilizados (Yuri Ribeiro e Gedson),  em contraposição  ao FC Porto com  três titulares (Manafá, Pepe e Danilo - 27%),  um suplente utilizado (Bruno Costa) e um não utilizado (André Pereira).  
Cada qual definiu  o seu caminho: o Benfica, finalmente em sintonia com a base de formação no Seixal,   confirmando  o presente e abrindo as portas ao futuro; o FC Porto,  mais virado para o consumo imediato,  optando por comprar  já feito  e por medida em vez de investir num projeto próprio, que abraçou  e desabraçou.
Faltam cinco jornadas e a atitude jornalística mais sensata  será a de esperar para ver.  Que aconteça desfecho que anime  a discussão e agite este ramerrão em que a cada semana se repete o que foi perguntado e  respondido na anterior.
O FC Porto tem a tarimba e o Benfica a classe. Mais, acredito que os ventos de mudança sopram, e com força. À 16.ª jornada, quando Bruno Lage foi trazido à cena, o FC Porto era líder (39 pontos) e o Benfica quarto (32). Hoje, estão a par: prova de que o  dragão estagnou e a águia progrediu.  Provavelmente, um simples detalhe que também poderá  ser interpretado como anúncio de novo ciclo para os anos vindouros, com Benfica em alta e Porto em quebra. É a flutuação dos mercados…