A chinfrineira habitual

OPINIÃO12.02.202003:00

NO rescaldo do clássico (jogo intenso, enérgico e a espaços eletrizante entre as duas melhores equipas do país, o melhor até ao momento no campeonato) os departamentos de comunicação do Benfica e do FC Porto envolveram-se uma vez mais numa desgraçada troca de acusações e insinuações; reforçadas por declarações inflamadas do presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, que, entre críticas ao governo e aos presidentes da FPF e da Liga, largou a seguinte pérola: «Temos de acabar com a suspeição.»

Motivo desta chinfrineira ensurdecedora? O de sempre: arbitragem e quem a influencia e condiciona mais. Não foi o resultado do clássico. São as 14 jornadas que ainda falta jogar. E o que fez mais barulho foi o que perdeu o jogo. Nada de novo. O Benfica quer árbitros estrangeiros a apitar os seus jogos e também os do FC Porto (presume-se que até ao final da época) e fez um apelo à FPF para diligenciar nesse sentido. A ideia nem é nova… mas porquê só agora, Benfica? Porque não na 2.ª volta da época passada?... e nas retas finais dos últimos campeonatos, não teria sido boa ideia?... se calhar tinha. Mas enfim, nada de novo. Se o FC Porto tivesse perdido  o clássico (a julgar pelo que foi dito antes do queixume benfiquista) é quase certo que se atiraria ao Benfica com mais do mesmo ou equivalente. Bom. Já houve três dias para respirar fundo e a temperatura ainda não baixou. De qualquer maneira volto a dizer o que já disse aqui e em A BOLA TV muitas vezes: as trocas de acusações entre SLB-FCP e FCP-SLB não são para levar a sério. Fazem parte de uma estratégia velha e gasta que toda a gente conhece. Equivalem a conversas entre rotos e nus porque são eles, e não outros, os únicos clubes com capacidade de influenciar os centros de decisão e os meandros menos aconselháveis do futebol português. São eles, e não outros, os clubes que personificam a face mais perversa do sistema que traz o futebol português sob suspeita há bem mais de trinta anos. Ponto.

O FCP teve um sistema e mandou nos centros de decisão e nos meandros menos aconselháveis durante muitos anos. Agora vigora o sistema e o poder do Benfica. Cada um acusa o outro de tentar condicionar arbitragens e não só, mas cada um sabe muito bem (oh, se sabe) o que é que a casa do outro gasta. Só por isso, os insultos e acusações reciprocas que ouvimos nos últimos dias dariam vontade de rir se não revelassem a extraordinária falta de decoro - e de MEMÓRIA - de quem as profere. O país merecia ser poupado a este triste espetáculo do roto a invetivar o nu e vice-versa, com frequentes e recíprocas alusões às recíprocas porcarias: por cada fruta toma lá um padre; por cada café com leite toma lá uma missa; por cada apito toma lá um e-mail; por cada Calheiros toma lá uma toupeira.

Outra coisa: chega de dizer que os maus desta fita são os departamentos de comunicação. Não meus amigos, não são; basta desse eufemismo: os departamentos de comunicação do Benfica e do FC Porto fazem aquilo que os mandam fazer. Não comunicam tonterias e difundem insultos e insinuações graves por sua alta recriação ou por geração espontânea - tudo aquilo que comunicam foi certamente visto, aprovado e autorizado pelas respetivas direções - nem podia ser de outra maneira. Os comunicados não representam a opinião dos assessores de comunicação: representam a opinião institucional do clube e naturalmente vinculam as respetivas direções. Portanto, quando Benfica e FC Porto se insultam mutuamente e fazem estas tristes figuras (que não se vêm em nenhuma liga de topo), a responsabilidade é sempre de Luís Filipe Vieira e Pinto da Costa. Convém não perder isso de vista porque as coisas vão aquecer muito nos próximos tempos - e não é só no futebol.

Sobre o jogo, já foi tudo dito. O FC Porto provou que é mais forte que o Benfica no mano a mano (duas vitórias, 5-2) e Sérgio mostrou que tem mais experiência e jogo de cintura que Bruno Lage - o contrário é que seria surpresa. Mas o Benfica, por outro lado, tem provado que é mais implacável do que o FCP com as equipas pequenas: não perde pontos com elas. Continua, por isso, favorito. De qualquer maneira, no meio da chinfrineira dos últimos dias, haja alguém na Luz capaz de perceber por que razão o Benfica, imperial e castigador com a arraia miúda, tem soçobrado sistematicamente perante adversários verdadeiramente encorpados (FC Porto e os da Liga dos Campeões).