A bela uva cabernet sauvignon
‘Lá em baixo’? Há portistas em todo o lado, meu caro. Lá em cima, lá em baixo e lá aos lados
H Á quase dez anos, quando Bruno de Carvalho chegou à liderança do Sporting, foram muitos, entre benfiquistas, portistas e outros istas, que gozaram com o modo como o presidente dos leões elaborava os contratos dos jogadores contratados. Colocava-lhes cláusulas de rescisão altíssimas , impedindo que tubarões mundiais os contratassem a preços da uva mijona. Iván Piris? Cláusula de 25 milhões de euros. Gerson Magrão? 30. Shikabala, Sarr, Rosell, Rabia, Schelotto ou Piccini? 45. Bas Dost, Acuña, Mathieu, Bryan Ruiz, Doumbia, Petrovic, Castaignos, Alan Ruiz e Federico Ruiz? 60. Bruno Fernandes? 100. Nenhum deles (claro) saiu do Sporting por aquele valor. Tal como quase nenhum, benfiquista, portista ou outro ista sai pela cláusula de rescisão. Porém, Bruno de Carvalho tentava impedir o que se passara com João Moutinho em 2010.
V EM isto a propósito de Francisco Conceição. Internacional em todos os escalões jovens, potencial para chegar muito longe, desequilibrador tremendo em vários dos jogos do FC Porto na época passada, não pode ter uma cláusula de rescisão de 5 milhões de euros. Doze vezes inferior, por exemplo, à de Federico Ruiz. Quem? Sim, esse: Federico Ruiz. Isto, claro, na perspetiva do clube. Na do jogador, é belíssima cláusula de rescisão. Não se sabe até onde chegará Conceição, sente-se que tem potencial para, daqui por poucos anos, valer dez vezes mais. O Ajax pode ter comprado uva cabernet sauvignon a preço de uva mijona.
H Á muitos anos, em meados dos anos 70, era necessário dar pontapés em meia dúzia de pedras de Lisboa, Évora ou Faro, por exemplo, para debaixo de uma sair um adepto do FC Porto. De 1977/1978 para cá, a repovoação clubística de Portugal transformou-se e há portistas em todo o lado. Em Lisboa, Reguengos de Monsaraz, Évora, Vila do Bispo, Faro, Vila Real de Santo António e talvez até na Isla Cristina. Agora damos um pontapé numa pedra alentejana, ribatejana ou algarvia e saltam de lá meia dúzia de portistas. O FC Porto é um clube nacional. Porém, com um presidente que, sendo o mais vitorioso a nível mundial, pensa como pensava há mais de 40 anos. «Festejaremos muitas vitórias, por muita azia que isso provoque lá em baixo», disse PC há uns dias. Lá em baixo? Há portistas em todo o lado, meu caro. Lá em cima, lá em baixo e lá nos quatro lados. Atribuir a Lisboa exclusividade benfiquista e sportinguista é uma parvoíce tão grande como colocar cláusula de rescisão de 5 milhões de euros no contrato com uma uva cabernet sauvignon.
P EDRO PABLO PICHARDO é uma uva cabernet sauvignon quase perfeita. Será perfeita quando chegar aos 18,30 metros do recorde do mundo. E não é luso-cubano. É só português.